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periferias 9 | Justiça e direitos nas migrações Sul-Sul

O legado da Revolução Haitiana

Reconhecer o marco histórico da revolução para o Sul Global é um primeiro passo para o resgate de sua grandeza e importância

Jailson de Souza e Silva e Richemond Dacilien

| Haiti |

setembro de 2023

Mulambo

A revolta dos escravizados de “Saint-Domingue”1 Nome do Haiti durante o período colonial francês (1697-1804). e posterior vitória do exército local contra o de Napoleão, então considerado o mais poderoso do mundo, culminou na independência do que passaria a ser o país chamado Haiti, em 1804. Entender de forma apropriada essa revolução e seus aspectos axiais nos permite responder a duas questões fundamentais sobre o caráter do evento e a construir uma proposição radical, mas lógica e absolutamente justa.

A primeira questão: Por que e como uma revolução tão original e potente foi apagada/invisibilizada da história universal, mas principalmente da América Latina e do restante do Sul Global? A segunda: qual é a relação entre aquela revolução e as instabilidades econômicas e políticas que dominam o Haiti desde o século XIX? A resposta a ambas questões contém o argumento necessário para nossa proposição consequente: no Sul Global, é preciso a reconhecer a Revolução Haitiana — e não a Francesa — como o marco instituinte da chamada Era Contemporânea. 

A resposta às duas questões assinaladas exige a descrição, de forma sucinta, do que foi a Revolução Haitiana e de suas características centrais. O ponto que mais chama atenção é que, ao contrário das revoluções francesa e americana do século XVIII — a primeira hegemonizada pela burguesia e a segunda por colonos que mantiveram intacta a estrutura escravocrata herdada da colonização inglesa —, a Revolução Haitiana foi obra de revoltas sangrentas de negros, que defendiam a liberdade, a igualdade e o direito à propriedade de terras. Nascida, pensada, planejada e executada na colônia francesa mais produtiva do período colonial, a Revolução Haitiana foi dirigida pelos escravizados e duramente combatida exatamente pelos vitoriosos herdeiros da Revolução Francesa.

A consagração dos direitos humanos 2Foi no âmbito da Revolução Francesa que foi proclamada, em 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.— tão alardeados como legado daquela revolução — se restringiu a atender uma parcela específica da humanidade: a população branca europeia ou dela descendente. A violência contra a população negra e os povos indígenas seguiu se fazendo presente nas colônias estabelecidas pela metrópole francesa — e em outras colônias e países do continente e ao redor do mundo. 

A revolução dos escravizados haitianos foi inédita no sentido de buscar materializar para toda a humanidade os ideais dos Direitos Humanos, se constituindo como a primeira revolução da história que reunia, radicalmente, a aspiração republicana e a perspectiva democrática em seu aspecto socioeconômico e político — tendo a abolição da escravatura e o acesso à propriedade da terra como objetivos centrais, contado como premissa o caráter racial

A revolução dos escravizados haitianos foi inédita no sentido de buscar materializar para toda a humanidade os ideais dos Direitos Humanos, se constituindo como a primeira revolução da história que reunia, radicalmente, a aspiração republicana e a perspectiva democrática em seu aspecto socioeconômico e político — tendo a abolição da escravatura e o acesso à propriedade da terra como objetivos centrais, contado como premissa o caráter racial. Liderada por pessoas negras e pessoas dedicadas à libertação da condição de pessoas escravizadas, a Revolução Haitiana foi, portanto, um movimento de caráter antirracista, anticolonialista e antiescravista. 

[ antirracismo ] O imaginário que sustentava, no plano simbólico, a escravidão representava a pessoa "negra" como um ser corpóreo, primitivo e bárbaro, quase irracional. Ela seria, então, incapaz de compreender o significado de liberdade por não ter as habilidades necessárias para produzir os conceitos que o sustentam. Todavia, a insurreição dos escravos da ilha de São Domingos e a independência construída foram uma demonstração da capacidade das pessoas negras de reconhecer o valor da liberdade, colocando inclusive suas vidas em risco para conquistá-la. Não por acaso, na primeira Constituição do país, em 1805, a hierarquia racial na qual o sistema escravocrata se baseava foi imediatamente desafiada e eliminada. 

[ anticolonialismo ] Quando a independência foi proclamada, os franceses foram proibidos de possuir terras no Haiti, e suas propriedades — fruto do privilégio de serem representantes da metrópole — foram expropriadas. Os dirigentes da revolução tinham consciência do que estruturava o sistema colonial e da importância de romper com suas bases econômicas, jurídicas e institucionais. Assim, colocavam em disputa para o futuro a questão fundiária no Haiti, no que esperavam que se constituísse como uma reforma agrária no país.

[ antiescravismo ] A primeira constituição haitiana declarou que qualquer pessoa negra (africana) que tocasse o solo do Haiti seria automaticamente livre. Em meio a um ambiente hostil, uma vez que todos os outros países da América ainda estavam sob o jugo da escravidão no início do século XIX, os líderes da primeira República Negra demonstraram que a independência não faria concessão ao escravismo3Para mais informação sobre esse aspecto na história da revolução haitiana, veja: Hurbon, L. L’Insurrection des esclaves de Saint Domingue (22 au 23 août 1791). Paris: Karthala, 2000..

 

Os imensos desafios do novo Estado Independente

Esse caráter inédito da revolução haitiana fez com que seus líderes e o povo, em geral, pagassem um alto preço. Em primeiro lugar, no plano interno, precisaram construir, sem base em nenhuma experiência política prévia, um Estado-Nação em um território que havia passado por diferentes tipos de regime em pouco tempo e dominado por uma estrutura institucional secular construída para atender os interesses da metrópole francesa. No plano externo, a insurreição negra e a construção do Haiti como país provocaram um imenso trauma nas colônias e países da América, desde os EUA — onde o governo de Thomas Jefferson temia pela frágil unidade entre o Norte e o Sul — até o Brasil, onde o temor de uma revolução similar provocou o acirramento do controle dos corpos e da opressão sobre os escravizados — proibidos de terem acesso à leitura e escrita, ou a simplesmente conhecer o que aconteceu na revolução no Haiti.

Naquele contexto, destruir as bases da experiência de Estado-nação que estava se constituindo no Haiti se tornou uma estratégia comum aos países europeus, suas colônias americanas e os EUA. Na busca de reconhecimento internacional, o Haiti teve que indenizar os escravocratas franceses por sua luta pela liberdade — um imenso paradoxo. Como consequência praticamente inevitável, sua economia foi arruinada, e como agravante, líderes da revolução foram assassinados. Nesse processo, se fortaleceu, com apoio dos países coloniais, um grupo político hegemonizado por mestiços — filhos de franceses com escravizadas — que dominou o Estado e evitou que medidas estratégicas, tal como a reforma agrária, seguissem caminhos práticos e políticos. 

A disputa pelo controle do Estado nascente estabelecida entre os diferentes grupos políticos/sociais haitianos teve impacto nos caminhos da revolução. Acima de tudo, a pressão internacional para que o país indenizasse os franceses proprietários de escravizados e de terras como condição para ter sua independência reconhecida e — a partir de disso, poder ter acesso aos mercados dos países controladores do comércio internacional — implicou obstáculos evidentes ao país.

Impor  essas condições ao Haiti, país recém liberto do colonialismo francês, carrega uma dimensão que atravessa historicamente os dois séculos do país. Desde de então as condições de negociação históricas entre o Haiti e o Norte Global  têm sido fator determinante da privação do Haiti da capacidade de gerar recursos econômicos internos suficientes para estabelecer os caminhos do desenvolvimento nacional, mesmo que já no contexto de 1804 manter autônoma sua capacidade produtiva pudesse ter sido decisivo.  

Um golpe profundo na primeira república de pessoas negras libertas se seguiu na era moderna/contemporânea, com a ocupação/invasão militar dos EUA iniciada em 1915. Motivada por uma suposta instabilidade política que exigiria a intervenção, o país vizinho executou um processo de “colonização” efetiva do Haiti e nele permaneceu por três décadas, explorando seus recursos naturais, tutelando os governos que estabelecia a seu bel-prazer e controlando as atividades econômicas de acordo com interesses próprios.

A retirada das tropas norte-americanas em 1934 — sob a acusação de terem se apropriado de toda a reserva de ouro depositada nos cofres públicos do país — agravou a desestruturação econômica do Haiti e teve como legado mais perverso a instalação de François Duvalier — o Papa Doc — no poder em 1957,  seguido em 1971 por seu filho de apenas 19 anos4Por mais explicação sobre a invasão americana do Haiti, veja o texto de historiadora haitiana, Suzy Castor: Castor, S. L'occupation américaine d'Haïti. Jean-Claude Duvalier — Baby Doc —, sucessão imposta ao país pelo controle dos Duvalier. 

A dinastia permaneceu no poder até 1986, quando o levante popular fruto da luta contra as brutalidades e opressão do regime ditatorial apoiado pelos EUA e França, especialmente5Retirado do poder, Baby Doc se estabeleceu inicialmente nos EUA e depois na França. Apenas 25 anos depois, ele voltou para o país natal, morrendo em 2014., depôs os Duvalier. Durante aquele período, grande parte da população foi alijada do processo político e o Estado foi radicalmente privatizado por interesses particulares. 

Uma tentativa de superar esse processo de supressão dos direitos do povo haitiano ocorreu através da eleição de Jean-Bertrand Aristide, em 1991. Considerado o primeiro presidente eleito democraticamente no país, o ex-padre ligado à Teologia da Libertação teve seu mandato rapidamente encerrado por um golpe militar. Aristide retornou ao governo em 1994, e nele ficou até 1996, além de ter governado entre 2001 e 2004. A análise da gestão de seu governo até hoje divide opiniões no país. O que fica mais evidente no período é o aprofundamento da instabilidade política, especialmente após a tomada do poder pelos EUA, com apoio da França e de uma força de ocupação internacional que tinha militares do Brasil como chefes militares. 

A Missão das Nações Unidas para a estabilização do Haiti — MINUSTAH — foi criada sob o argumento de que o país estava dominado pelo caos, violência e por gangues que controlavam parte significativa dos territórios do país, em particular sua capital Porto Príncipe. Na verdade, como em outras experiências do passado, a intervenção não contribuiu para resolver os problemas para os quais tinha sido designada pelas Nações Unidas, além de ser acusada de múltiplas violações dos direitos humanos e de ter sido responsável, através de militares dela integrantes, pela disseminação de uma epidemia de cólera responsável pela morte de mais de dez mil pessoas, em 2010.

O reiterado fracasso das forças internacionais foi acompanhado, também em 2010, de um dos terremotos mais fortes já sofridos pela ilha do Caribe. Seu impacto foi terrível particularmente na capital Porto Príncipe. O terremoto resultou em mais de 100.000 pessoas mortas, centenas de milhares de feridos e mais de um milhão de desabrigados. Em que pese sua magnitude, é um equívoco responsabilizar o desastre natural pelos problemas do Haiti. Muitos países sofrem fortes terremotos que não provocam o mesmo impacto. A fragilidade do Estado e da sociedade haitiana, dominada em toda sua história pela pressão colonial e criação de obstáculos para o fortalecimento de um projeto autônomo de nação são razões que explicam, com mais precisão, a dificuldade do país em responder a desastres naturais como o terremoto de 2010.

 

O Petro Caribe, a violência política e a instauração do medo pelo governo contra o levante popular 

O Petro Caribe foi uma aliança petrolífera estratégica assinada entre a  Venezuela e o Haiti em 2006. A Venezuela de Chávez vendia petróleo para o Haiti a um preço reduzido. O governo haitiano devia pagar uma parte e economizar a outra para devolver à Venezuela em um prazo de 25 anos. O governo nacional deveria usar o dinheiro extra para favorecer o crescimento da economia haitiana e financiar programas sociais para a população. Em vez disso, 4,5 bilhões dólares americanos emprestados entre 2006 e 2018 desapareceram e os haitianos pouco viram dos benefícios prometidos.

O programa se encerrou em 2017, coincidindo por um lado com o enriquecimento inexplicável de muitas pessoas que participaram dos regimes anteriores, e por outro, com o empobrecimento da maioria da população. Essa situação questionável provocou, em 2018, uma mobilização cidadã contra a corrupção que exigia explicações do governo. Esse movimento contra a corrupção começou com uma simples pergunta em crioulo que ocupou as redes socias: Kot kòb petwo karibe a? ("Cadê o dinheiro do fundo Petro Caribe?"). Ela viralizou ao ponto de atingir 3 milhões haitianos nas redes — 30% da população do país. Após a disseminação, houve um levante de  jovens a  protestar nas ruas contra a corrupção.

A mobilização cidadã fez com que o Tribunal de Contas do Haiti realizasse uma investigação que revelou o desvio de mais de três bilhões e oitocentos milhões (U$ 3,8 bilhões) de dólares americanos, implicando quatro ex-presidentes e mais de vinte ministros de governos passados. Entre eles se inclui o ex-presidente Jovenel Moïse, pertencente ao mesmo partido político que Michel Martely (seu predecessor e membro do mesmo regime político de extrema direita). Martely acabou sendo acusado de participar na dilapidação do fundo Petro caribe. 

Antes da ascensão ao poder, Jovenel Moïse, um empreendedor econômico teve sua atuação investigada. Pela lavagem do dinheiro desviado pelo regime Martely preparou o caminho para a eleição de Moïse6Este regime chegou ao poder com a cumplicidade da Comunidade Internacional em 2011. Em 2016, foi reeleito em uma eleição sem legitimidade popular, com apenas 21,69% de participação da população do país.

Antes de Moïse ser assassinado quando ainda estava no poder, uma grande parte da população reivindicava o “Julgamento Petro Caribe”. Vale notar que, com a implicação de Moïse e seus aliados políticos no sistema de corrupção, seria muito difícil materializar o julgamento. Essa foi uma das razões que incentivaram a mobilização da população e sua saída às ruas, em 2018, pedindo a demissão de Moïse e o fim do sistema oligárquico.

O ex-presidente Jovenel, junto com ideólogos do regime de extrema-direita no país (PHTK), instauraram um regime de violência e medo a fim de se proteger do movimento popular. Eles buscaram organizar as eleições para passar o poder a uma pessoa de confiança, que lhes garantisse a proteção e evitasse investigações sobre seus atos. Além disso, com a cumplicidade de alguns países colonialistas, buscaram realizar um referendo sob seu controle para ter uma cobertura legal em relação ao escândalo de corrupção revelado pelo Tribunal de Contas. 

A população seguiu com a reivindicação de um governo de transição que realizasse o julgamento dos acusados de desvio dos recursos do Fundo Petro Caribe e sua prisão. Uma transição que rompesse com as políticas antipopulares, antidemocráticas e antirrepublicanas. O regime resiste à vontade popular e institui um regime de terror que realiza massacres nas favelas do país, especialmente na região metropolitana da capital. 

Fica evidenciado que, durante a segunda década deste século, os conflitos políticos se ampliaram e as disputas entre os diferentes grupos políticos pelo controle do Estado se caracterizaram pela ausência de uma força hegemônica na sociedade haitiana. Essa situação de crise culminou no assassinato do presidente Jovenel Moïse, em 2021, por razões até hoje não esclarecidas. A violência contra o presidente foi seguida pela falência institucional do país, que, dois anos após o crime, segue sem poder legislativo e sem data para a realização de uma eleição para o posto e que permita a sucessão de Ariel Henry, primeiro-ministro mantido no poder pela coalizão de países — liderada pelos EUA — que controla, de fato, o processo político desde então.

 

A herança da Revolução Haitiana e a superação da visão colonial da história

A historicidade apresentada evidencia como foi se produzindo a realidade contemporânea do Haiti e, em concomitância, foi constituída e tornada hegemônica a narrativa de que o Haiti é um país que “não deu certo”, como se seus problemas  fossem oriundos da incapacidade de seu povo de construir um projeto de nação democrática, próspera e baseado na justiça racial/social. Esta é a versão dominante no mundo a respeito da revolução mais radical e pró-humanidade da história. 

Na verdade, o que a análise mais detida da realidade haitiana revela, à luz de uma leitura crítica de sua história, é a imensa luta de seu povo por construir novas possibilidades para sua existência; a afirmação de um forte orgulho pela construção da nação e o sentimento de dignidade resultante; o forte vínculo comunitário estabelecido na vida cotidiana, com a criação de estratégias plurais para lidar com as insuficiências em termos de acesso a equipamentos e serviços urbanos, falta de empregos e renda, além da incapacidade do Estado para garantir a própria soberania sobre o conjunto dos territórios do país — o que não difere, por exemplo, do Estado Brasileiro. 

Neste quadro, cabe superar qualquer tipo de narrativa centrada na caracterização do Haiti como um “país inviável”. É necessário, em primeiro lugar, reconhecer o papel protagonista de seu povo na construção da revolução mais importante da história e — como ponto de partida fundamental — garantir a devida reparação por parte de França e EUA pelos problemas econômicos, sociais e políticos do país. Garantido isso, e a partir da escuta efetiva e participação da população, as forças nacionais comprometidas com a democracia devem se mobilizar para constituir um projeto ampliado de recuperação e valorização das instituições republicanas, de desenvolvimento econômico, social e ambiental, além de um pacto nacional de defesa da vida, da democracia e de todos os direitos fundamentais.   

Esse processo não acontecerá de forma espontânea. Cabe que países como o Brasil, governado atualmente por um presidente engajado no fortalecimento da democracia e na superação da desigualdade entre os países do Sul e do Norte Global, se engajem na busca de uma solução para a crise atual do Haiti que tenha como base o respeito à sua autodeterminação e o compromisso em construir uma solução pactuada para o país.

Nesse quadro, as forças políticas haitianas, os cidadãos que vivem na diáspora e pessoas de todo o mundo devem se engajar na pressão internacional por uma solução da questão haitiana que valorize a história de seu povo e, a partir de seu reconhecimento, contribua para a construção de um presente pleno de dignidade e valorização da herança e legado do povo escravizado que se fez livre. Mais que isso: que deu a maior lição já sofrida pelos colonizadores da América, que seguem no poder mundial e devem ser continuamente cobrados em suas responsabilidades pela persistência do racismo que criaram — sustentador da estrutura simbólica e material da escravidão —, mas que seguem hoje mantendo práticas econômicas e políticas que reproduzem as diversas formas de desigualdade e violência que assolam o povo das periferias.

A luta do povo haitiano não é isolada e eles não são vítimas passivas de um sistema internacional construído a partir do colonialismo. Eles são a expressão dessa violência histórica, mas também da resistência manifesta pelo povo negro e sua capacidade de resposta a ela, que segue tão necessária quanto foi em 1804.

O grande legado da Revolução Haitiana no século XIX foi servir de farol para as lutas anticoloniais em toda a América Latina. Sua influência com Bolívar, por exemplo, foi central para a vitória contra a Espanha e o ponto de partida para a independência de todo o continente. Além disso, foi a referência fundamental para a materialização de múltiplas insurreições de escravizados/as e alimentou o imaginário da luta contra a escravidão de forma tal que tornou impossível sua manutenção.

Trata-se de pactuar um compromisso entre todas as pessoas, instituições e países comprometidos com a democracia e com os direitos humanos, em particular do Sul Global, em reconhecer a dívida histórica com a Revolução Haitiana e seu povo. Reconhecê-la como o marco histórico que gerou a Era Contemporânea é um primeiro passo para o resgate de sua grandeza e importância. A partir daí, afirmar o compromisso de fortalecer a democracia no país, contribuir para encontrar soluções para a crise econômica e política na qual vive — situando o peso do colonialismo em sua produção — e reconhecer ao povo do Haiti o direito à autodeterminação e efetiva independência. 


 

Jailson de Souza e Silva | BRASIL |

Geógrafo, doutor em Sociologia da Educação, fundador do Observatório de Favelas e da UNIperiferias/IMJA e co-investigador no projeto MIDEQ.

@jailson_de_souza_e_silva

Richemond Dacilien | HAITI |

Pesquisador do Instituto Maria e João Aleixo (IMJA) no projeto do MIDEQ, doutorando em Política Social pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFAM), mestre em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas (UFES) e bacharel em Serviço Social pela Universidade de Estado do Haiti (UEH).

@ricardodacilien

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