Humanizando o outro
Combatendo o estigma em contexto de conflito histórico
Anam Zakaria
| PAQUISTÃO | ÍNDIA |
julho de 2019
traduzido por Daniel Stefani
"Agora sei que nem todos Paquistaneses são assassinos. Não querem me matar. Eu também posso pensar em ir ao Paquistão”, disse uma estudante após uma chamada de vídeo por Skype feita comigo desde sua escola, na Índia. Durou uma hora, e a chamada mudou sua percepção sobre meu país. Eu me perguntava o que teria acontecido caso não tivéssemos nunca conversado, caso ela nunca tivesse uma oportunidade de encontrar ou conversar com um(a) Paquistanês(a). Será que permaneceríamos sendo assassinos na percepção dessa estudante? Do outro lado da fronteira, no Paquistão, quando entreguei um cartão postal de um estudante indiano a um estudante do sexto ano - como parte de um programa de intercâmbio que coordenava para um ONG local, a Arquivo dos Cidadãos do Paquistão - ela começou a chorar. Quando perguntei o que tinha acontecido, respondeu-me que, por ter olhado para o cartão postal, o qual retratava uma deidade Hindu, seus olhos tinham pecado. Hindus, como ouvira falar, queimavam todos no inferno. Ela ficou aterrorizada pela possibilidade de se tornar uma "delas" simplesmente por ter olhado para uma fotografia de uma deidade e que agora, disse, também ela estaria destinada ao fogo do inferno.
Nos últimos nove anos, tenho trabalhado com crianças da Índia e Paquistão para compreender as percepções que carregam em relação ao outro e para construir diálogos possíveis. Enquanto me deparava com o interesse de vários(as) dos(as) estudantes, dispostos(as) e ansiosos(as) para interagir com outros(as) estudantes do lado oposto da fronteira, outros(as) compartilharam sua relutância ou recusa imediata em conversar com sua outra parte, aquela além da divisa. No Paquistão, estudantes me contam ter ouvido falar que Indianos e Hindus - termos utilizados como sinônimos - mataram seus ancestrais paquistaneses na Partição; dizem não querer nada com Indianos(as). Do outro lado, estudantes na Índia dizem que Paquistaneses são terroristas, e por que crianças, afinal, relacionariam-se com terroristas? A ironia, no entanto, é que a maioria dos Indianos e Paquistaneses chegaram a essa conclusão sem nunca ter mesmo conhecido o Outro(a). Em pesquisa, a Gallup Pakistan revela que 76% de Paquistaneses(as) nunca sequer conheceram um(a) Indiano(a). À maioria Indiana, restrições de vistos e fronteiras hostis implicam a impossibilidade de atravessar a fronteira - sendo que muitos(as) nem mesmos a isso estão dispostos. Entretanto, isso não significa que o Outro(a) – aqueles(as) do outro lado da fronteira – simplesmente inexistam para as pessoas da Índia e Paquistão. Pelo contrário, o(a) Outro(a), seja Hindu, Sikh ou Muçulmano(a), Indiano(a) ou Paquistanês(a), vive em nossos livros didáticos, debates de TV, histórias orais, discurso público e em nossa imaginação coletiva. Na verdade, sob muitas formas Índia e Paquistão hoje tendem a se definir como oposição em relação ao outro. No entendimento popular, a Índia é tudo que o Paquistão não é: progressiva, forte na economia e estável politicamente; ao mesmo tempo, o Paquistão também é tudo que a Índia não é: Mulçumano e puro (a palavra Pak, de Pakistan, literalmente traduz pureza), oposto ao "kafir" ou "infiel" que se encontra no outro lado da fronteira. O patriotismo, então, assumiu novos significados, manifestando-se na hostilidade e na monstrualização do(a) Outro(a). Desde a Partição de 1947, os dois países já passaram por três guerras, e se viram à beira de tantas outras.
Na década de 1940, como consequência de um lento processo de descolonização que começava a se desdobrar ao redor do mundo, a Índia, assim como tantos outros estados colonizados, precisou abordar uma série de significativas questões sobre governança e política. Uma das mais críticas questões se direcionava a qual relacionamento e equilíbrio de poder a maioria Hindu e a minoria Muçulmana compartilhariam na Índia "livre", após os quase 200 anos de colonização Britânica. Os Muçulmanos, que já enfrentavam privação econômica e marginalização, preocupavam-se com o tratamento que os esperava após a saída Britânica. Enquanto Muhammad Ali Jinnah, Fundador do Paquistão, e seu partido político, a Liga Muçulmana, inicialmente atuaram por justiça para minorias e emancipação dos Muçulmanos na Índia não-dividida, a luta por direitos se manifestaria na demanda por um país separado: o Paquistão. Entre estudiosos(as) e historiadores(as), muito se debateu: se Jinnah de fato queria uma nação separada, ou se usava a demanda de criação do Paquistão como uma tática que pressionasse e assegurasse direitos para Muçulmanos(as) na então Índia não-dividida.Como parte desse movimento, Jinnah argumentou que Muçulmanos do subcontinente eram uma nação separada, pertencente a uma civilização diferente da dos Hindus.De acordo com Ayesha Jalal, eminente historiadora paquistanesa, ao ter usado a "Teoria das Duas Nações”, Jinnah buscava assegurar à Liga Muçulmana uma fatia justa do poder central. Assim como a história confirmaria, aos Muçulmanos(as) não se garantiu os direitos exigidos por Jinnah; anunciada, a Partição foi amplamente executada pelos Britânicos.
Na época, o anti-secularismo alcançava incursões significativas na Índia. Apesar das centenas de anos de coexistência, de fato havia desacertos, os quais foram apenas exacerbados e explorados pela famosa política Britânica do dividir e governar. Em um território em que identidades religiosas poderiam ser fluidas, Britânicos impuseram rígidas categorias, classificando Muçulmanos, Hindus, Sikhs e outras minorias religiosas em ordenações binárias, ignorando que coincidiam em muitas de suas práticas. Essas identidades político-religiosas se cristalizaram ainda mais com a Partição; estima-se que a violência inter-religiosa tenha matado de 200.000 a 2 milhões de pessoas, tendo deixado outras 14 milhões de pessoas desalojadas. Massacres brutais, pilhagem e estupro ensanguentariam as cidades e vilas à medida em que Britânicos traçavam linhas dividindo as províncias de Punjab e Bengal em duas.
Um homem, que à época da Partição tinha apenas 5 anos de idade, chegou a me dizer que, mesmo após décadas, não conseguia apagar da memoria as imagens daquele tempo: “ainda hoje me adoece pensar nos corpos de homens, mulheres e crianças esquartejadas”.1Abhi bhi mein un kuti hoey aurton, mardon, bachon ke baray mein sochta hoon tou meri ajeeb halat ho jati hai. Sua esposa em seguida narra como sete homens de sua família foram mortos durante a Partição; as mulheres se jogariam em foças para salvar a própria honra; preferia-se a morte, considerada mais "honrável”, do que o sequestro seguido de estupro nas mãos dos homens da Outra comunidade. Outras tantas narrativas, de trens repletos de corpos massacrados, de vizinhos voltando-se contra vizinhos ao passar da noite, da queima de casas e dos saques generalizados, da violência sexual e da matança - estão impressas nas mentes de milhões de sobreviventes da Partição, em ambos os lados da divisa.
Com essas violentas narrativas, profundamente inseridas no imaginário coletivo da geração da Partição, tem sido difícil para muitos(as) "seguir em frente" ou abandonar a hostilidade contra o(a) Outro(a). Minha própria avó ficou horrorizada quando disse a ela que visitaria a Índia. "Só tem cobras morando lá", me alertou. Ela tinha 22 anos na Partição e foi voluntária no maior campo de refugiados de Lahore, então localizado em Walton, hoje território paquistanês. Durante minha infância, contou-me do sangue que se espalhava pelos trens que chegavam às estações, das sofridas condições dos(as) refugiados(as), dos quantos corpos voluntárias(os) como ela ajudaram a enterrar. Angustiava-a muito a ideia de a neta visitar o país "inimigo". Com Paquistão e Índia a beira de perderem suas gerações da Partição, ativistas da paz, muito embora bem-intencionados(as), defenderam que, quanto mais distante da Partição, mais fácil será para que a juventude dos dois países "esqueça" o derramamento de sangue e desenvolva novas relações entre si. Afinal, não sofreram como os avós.
Dependendo de histórias pessoais de família, classe social, da exposição ao Outro vivida em países periféricos, e de outras dinâmicas singulares – inúmeros(as) Indianos(as) e Paquistaneses(as) podem e puderam superar a desconfiança e enfim estabelecer relações. A interação que pude ter com Indianos no Canadá, com vinte e poucos anos, foi transformadora - e me ajudou a desconstruir a imagem do "inimigo" e a humanizar Indianos, ensinados a odiar. No entanto, para outros(as) Indianos(as) e Paquistaneses(as), a distancia cada vez maior da Partição só se traduziu em crescente hostilidade. Isso, pois ao contrário do entendimento popular, a Partição não é um evento estático contra o qual basta apenas se "deslocar”, já que, passados 72 anos da divisão do subcontinente indiano e do nascimento do Paquistão, a Partição permanece em curso, baseando a política da Índia e do Paquistão, influenciado debates na mídia, nacionalismo, políticas estrangeiras e a formação da identidade.
Livros no Paquistão estão repletos de sentimentos anti-Índia e anti-hindus, mantendo viva a divisão e usando a "Teoria da Duas-Nações" para ditar as tendências ideológicas das gerações futuras. Declarações como: "Hindus não poderão nunca se tornar verdadeiros amigos de Muçulmanos", "foram os Hindus que começaram o genocídio contra os Muçulmanos”, e "Hindus prejudicaram Muçulmanos de todas as formas possíveis” - são comumente encontradas em textos sancionados pelo Estado do Paquistão. Tariq Rahman, acadêmico paquistanês, constata: "textos Paquistaneses não conseguem se referir a Hindus sem chamá-los de malandros, ardilosos, enganadores ou algo igualmente insultuoso”. Ao mesmo tempo, na Índia, imagens de Muçulmanos como "selvagens" ou "bárbaros" tem sido popularizadas por Bollywood e pelo discurso hegemônico.2National Commission for Justice and Peace (NCJP). Education Vs. Fanatic Litteracy. (Sanjh Publications, Março, 2013), p.7. Apesar de textos Indianos terem sido reformulados com o passar do tempo, visando eliminar o sentimento de ódio explícito, alguns analistas, como Krishna Kumar, propõem a seguinte narrativa para a Partição: a de um evento isolado no tempo, que atribui aos Muçulmanos a responsabilidade por desmembrar uma parte integral da Índia, isso, sem propor qualquer explicação holística sobre porquê o movimento de criação do Paquistão existiu.As duas mais recentes revisões de textos governamentais, sob incumbência do governo BJP, Bharatiya Janata Party, o Partido do Povo Indiano, glorificam a comunidade Hindu, e assim trazem a preocupação de que se encoraje o extremismo nacionalista em livros escolares.Já houve quem os acusasse de reforçar a "visão mundial do majoritarismo Hindu" e eliminar "identidades de minoritárias”.
Se apenas se limitasse aos livros escolares, as fontes de aprendizado são ainda outras: os discursos hostis do Estado e a "construção do Outro" perpetuados por esses livros impactam profundamente um ambiente em que o contato pessoa-pessoa permanece limitado. Com tom sensacionalista, novos ancoras da TV nacional incendeiam ainda mais os debates; com a maioria das crianças sem ter nunca se deparado com um Paquistanês(a) ou Indiano(a) em seus respectivos países, textos e palavras têm o poder de se tornar verdade incontestável e, por isso, talvez não seja surpresa que, durante minhas visitas à Índia, estudantes me perguntavam se eu andava com Hafiz Saeed, cujo grupo que lidera fora acusado de ataques terroristas em território Indiano. Muito menos surpreenda que, uma vez em Mumbai, uma criança pequena, com não mais de 6 anos, correu de mim ao escutar que eu era Paquistanesa. Quando perguntei o que acontecera, ele me confessou que tinha medo de Ajmal Kasab, um dos Paquistaneses responsabilizados pelo ataque de 2008 em Mumbai, no qual 160 pessoas morreram.Até mesmo para uma criança tão nova assim, Paquistanês significava fundamentalista, terrorista. Foi assim que ele via Paquistaneses(as) representados(as) pela mídia, e assim os(as) imaginava. No Paquistão, um estudante com quem trabalhei me contou ter lido, em aula, 5 livros que se referiam aos Sikhs como assassinos de crianças, açougueiros que as cortavam em pedacinhos. Quando atravessou a fronteira comigo em um projeto de intercâmbio, contou estar aflito, temendo que Sikhs estariam esperando por ele com facas nas mãos. Banhou-se de alívio, ao vê-los a postos, mas com grinaldas e doces nas mãos.
Quando estava com meus 25 anos, retomei o assunto com minha avó. Disse: " Você me contou tantas as histórias sobre derramamento de sangue na Partição, sobre as condições dos refugiados, dos corpos que ajudou a enterrar. Mas você também vivia em uma área dominada por Hindus na pé-Partição, em Lahore, e você frequentava a escola. Você não tinha amigas ou amigos Hindus ou Sikhs? Como é que nunca falou sobre isso?" Para minha surpresa, minha pergunta virou uma conversa que relevou informações - confidenciais - a muitos de minha família. Pela primeira vez em vinte e cinco anos de vida, ouvia falar sobre as amigas Hindus de minha avó, Rajeshwari e Uma. Contou-me que a visitaram algum tempo atrás, várias décadas após a Partição: levaram Saris Indianos; minha avó, retribuiu presenteando-as com roupas tradicionais paquistanesas. Logo também me contaria sobre como o pai da amiga Sikh preservaria o nome Muçulmano de sua irmã mais nova, e como sua outra irmã fora resgatada por um Sikh em meio à violência da Partição. Essas foram histórias que escaparam da geração da minha avó. Me perguntei como teria sido se eu também nunca as tivesse escutado. Também me perguntei como outros(as) tantos(as) sobreviventes da Partição mantiveram anedotas e histórias guardadas tão assim secretamente nos corações, levando-as consigo ao silêncio do próprio tumulo.
Passei a entender que a Partição deve ser considerada por um espectro em que histórias de derramamento de sangue e harmonia frequentemente coexistiram. Estados-nação focaram apenas em histórias seletivas, enfatizando como a "outra" comunidade perpetrara toda a violência. No Paquistão, por exemplo, só se escuta falar sobre a violência Hindu e Sikh contra Muçulmanos. Para sobreviventes da Partição, contudo, a realidade fora bem mais complexa e também cheia de contradições, como a verdade geralmente é. Se foram, por um lado membros de uma determinada comunidade que matavam as pessoas, frequentemente vinham outros da mesma comunidade para resgatá-las. Enquanto tratavam Muçulmanos como intocáveis em algumas casas de Hindus, em outros casos, também as festividades religiosas Hindu ficariam incompletas sem a participação dos(as) vizinhos(as) e amigos(as) Muçulmanos(as), e vice-versa. Nuances assim foram apagadas por discursos endossados pelo Estado, encontrando seu lugar no arquivamento de memórias pessoais. Nos últimos anos, civis na Índia e Paquistão puseram em prática uma série de iniciativas para registrar memorias dos(as) sobreviventes da Partição. O Arquivo dos Cidadãos do Paquistão, o Arquivo da Partição de 1947, e o Museu da Partição, são algumas dessas empreitadas.Em um ambiente de crescente hostilidade, histórias orais como as apresentadas podem servir como uma importante forma para humanizar o Outro. Isso é particularmente verdade pois, apesar da violência que testemunharam e da amargura que carregam, sobreviventes da Partição também se lembram de um tempo em que o Outro não era realmente o Outro, mas sim, parte integral da sociedade.
Assim como constata Ashis Nandy, psicólogo político Indiano que conduziu extensa pesquisa sobre a Partição, "quem de fato vivenciou a violência, vítimas diretas, primeira geração de vítimas, quem viu com os próprios olhos eram, em sua maior parte, pessoas que tinham menos preconceito e amargura em relação à experiência que viveram, mais do que os(as) próprios(as) filhos(as) e netos(as), pois essa primeira geração viveu em uma comunidade em que o outro lado era a maioria... viveram em coexistência, e dessa experiência carregam acaloradas memórias. Muitos dizem que foram esses os melhores dias da vida, enquanto que as crianças carregam uma perspectiva muito enquadrada pelos dias violentos e por como a família fez para sobreviver... por isso carregam mais amargura, mais hostilidade".
Histórias contadas, histórias pessoais de famílias - podem, portanto, ser transformadoras. Uma mulher com quem interagi em Lahore, nascida anos após a Partição, contou que não gostaria nunca de visitar a Índia, nem que deixaria os filhos cruzar a fronteira. Seu pai perdera muitos membros da família na Partição em Kapurthala, hoje parte da Índia. Ao imaginar o país, apenas conseguia pensar no derramamento de sangue de seus ancestrais. Recusou-se a permitir que o filho fosse a Índia como parte de um programa de intercâmbio, temendo que, cruzando a fronteira, talvez nunca mais retornaria, à mercê do mesmo destino dos demais familiares que morreram na Partição. Entretanto, foi seu próprio pai, que sofrera e vivenciara o derramamento de sangue, quem insistiu que o neto tinha que viajar para o outro lado. "Ele está indo para casa", disse. "Nada vai acontecer com ele". Essa criança cruzou a fronteira, interagiu com Indianos e me confessou: a visita mudou completamente o que pensava. "Agora sei que Indianos são simplesmente como nós. Agora falo para todo mundo visitar, que a Índia não é nada do que a gente imaginava. Não há monstro nenhum se espreitando do outro lado, nada de facas, assassino nenhum.”
Infelizmente, experiências assim são limitadas. Enquanto que periodicamente restrições de vistos são abrandadas e governos da Índia e Paquistão dizem estarem abertos para o contato direto, pessoa-pessoa, com tantos pontos espinhosos entre si - as condições para viabilizar experiências assim podem se agravar a qualquer momento. Mais recentemente, os dois países se confrontaram a respeito dos 44 soldados mortos que integravam a Força Central de Reserva da Polícia Indiana. A Índia alega ter sido responsabilidade do Paquistão; bombardeios e uma situação próxima à guerra rapidamente se desenrolaram entre as duas potências nucleares. Apesar das tensões terem sido atenuadas, hostilidades assim entre os dois países não são nenhuma novidade - impedem viagens e interrompem o cíclico contato direto pessoa-pesssoa. Contudo, um meio de interação pôde ser capaz de se sustentar: o uso da tecnologia.
Durante os últimos anos, tenho utilizado o Skype para conectar crianças de escolas da Índia e Paquistão umas com as outras. Estudantes relutantes em se envolver com o Outro são encorajados a pesquisar sobre o outro país e a perguntar questões de cunho informativo, para que possam aprender sobre o outro, a partir do Outro. Essas trocas feitas por Skype podem desempenhar um papel chave para viabilizar que Indianos(as) e Paquistaneses(as) se "encontrem" virtualmente uns com os outros. Para a maioria, seria a primeira interação a ser preenchida com as inúmeras e ávidas perguntas direcionadas para pessoas sobre quem por muito tempo imaginaram, mas que raramente tiveram a oportunidade de conversar. As conversas variam entre discussões sobre estereótipos de cada um(a) e assuntos mundanos, como esporte, programas de TV e comida favorita. Após uma recente interação por Skype, uma estudante que inicialmente se recusara a integrar a conversa, devido ao que anteriormente tinha lido sobre Indianos em seus textos, disse: "Nossa, eles são exatamente como a gente! Comem a mesma comida que eu como... quando é que poderemos conversar com eles de novo?
Enquanto certamente não existe solução rápida para conflitos históricos, e mesmo a conexão não necessariamente equivalendo à paz ou ao amor em relação ao Outro, ela de fato humaniza quem imaginávamos como nossos inimigos. Nos últimos nove anos, vi dezenas de crianças se unirem por meio de trocas físicas e virtuais e, embora o impacto varie, nenhuma delas sai da sala sem alguma mudança sutil na compreensão sobre esse(a) Outro(a). De acordo com o estudo realizado pela Gallup Pakistan - 73% dos paquistaneses afirmaram que sua perspectiva sobre indianos mudou positivamente depois de terem se conhecidos.Enquanto a Índia e o Paquistão compartilham uma das fronteiras mais perigosas do mundo, esse contato pessoa-pessoa atravessa as linhas fronteiriças para nutrir uma geração futura mais tolerante.Essa geração talvez seja a única esperança para moderar a frágil paz dessa região tão nuclearmente armada.
Anam Zakaria | Paquistão |
AnamZakaria é autora de Foot prints of Partition: Narratives of Four Generations of Pakistanis and Indians (HarperCollinsPublishers 2015) and Between the Great Divide: A Journey into Pakistan-administered Kashmir (HarperCollinsPublishers 2018).
anamzakaria@gmail.com