Narrativas

periferias 7 | desaprisionar o cárcere

Trocando pauladas por asas

Ou quando os heróis são o motivo do crime que nos prende

Murilo Gaulês | Cia dxs Terroristas

| Brasil |

julho de 2022

“Eu cresci apanhando dos meus pais e não morri”

Passei boa parte da minha vida adulta ouvindo essa frase ou algo parecido de pessoas da minha geração. E por um certo tempo dessa mesma vida adulta eu concordei com isso. Até que comecei a perceber o quanto tinha dificuldade de expressar aquilo que eu sinto e como é difícil para mim dizer: NÃO. Envolvido em diversas relações abusivas, que perpassaram agressões físicas, tentativas de homicídio, estupro, fui percebendo que essa minha dificuldade de me expressar e essa tendência a me submeter a qualquer braço rijo que se impusesse sobre meu corpo, silenciavam minhas (re)ações, como se houvesse um botão de inércia que atuasse sobre mim toda vez que alguém tentava me calar com violência.

Eu apanhei muito dos meus pais e, realmente, eu não morri. Mas tenho crises de ansiedade e pânico. Sou uma pessoa insegura e frequentemente acho que aquilo que estou produzindo não é suficiente, que não basta, que está abaixo do aceitável. Eu estou passando por esse juízo agora mesmo, enquanto escrevo esse texto.

Corpas LGBTIA+ apanham o tempo todo. E de uma forma triste, aprendemos a lidar com as dores (e nos acostumamos com elas). Existe um prazer sádico na sociedade cisheteronormativa cristã em fazer de nossas corpas depositários do horror e territórios de expurgo de suas frustrações. Vivemos no país que mais mata pessoas LGBTIA+ em todo o mundo por 14 anos consecutivos.

Foto: Diego Nascimento

Nós já nascemos apanhando para engolir o choro. E quando, a partir da punição, somos apartados de possibilidades de aprendizagem, de experiências, de diálogos e compreensões que nos permitiriam assimilar o mundo a partir das relações coletivas e das trocas de saberes/desejos, passamos a autocentrar nossa percepção a partir de nosso senso de segurança, de autopreservação. Eu passo a me relacionar com o mundo pelo medo, e podemos fazer coisas horríveis quando esse medo é tudo que nos motiva a seguir adiante.

Esse comportamento punitivista é uma herança ocidental europeia, que chega em nossas terras junto com o processo de colonização.

Na Europa Medieval, pessoas eram mutiladas, enforcadas, queimadas vivas ou decapitadas em praças públicas para servir de exemplo “pedagógico” para que o povo aprendesse aquilo que não pode ser feito. Nesse período, as prisões existiam, não como uma pena em si, mas como um momento de espera para a sentença que, fatalmente, culminaria em homicídio, tortura pública ou mutilação. Tais práticas brutais perduraram por séculos com alternâncias estratégicas nos requintes de crueldade aplicados aos corpos minorizados.

Podemos lembrar, por exemplo, a figura de Charles Lynch, que fomentava execuções públicas contra indígenas e pessoas negras escravizadas para que servissem de exemplo ao tentar se rebelar contra seus escravocratas. Essas execuções eram acompanhadas de torturas cruéis que tinham por objetivo não apenas assassinar a vítima, mas deformar seu corpo de modo que a imagem que restasse (esquartejada, queimada, distorcida) fosse exibida como um totem da obediência servil. Alguns historiadores afirmam que Lynch, inclusive, produzia cartões postais com ilustrações desses corpos deformados e os enviava para vizinhos e amigos, como forma de difundir sua mensagem para outros territórios. Foi daí que surgiu o termo “linchamento”.

Pessoas negras eram escravizadas, estupradas, torturadas e vendidas como objetos por que a mentalidade cristã ocidental acreditava que essas pessoas não possuíam alma.

Pessoas LGBTIA+ eram e ainda são massacradas por uma leitura rasa e seletiva do livro de Levítico 18:221“Com homem não te deitarás, como se fosse mulher, abominação é”.

Indígenas são destituídos de suas terras por serem considerados preguiçosos e inaptos para o trabalho que — pela mesma moral cristã — dignifica a humanidade.

Pessoas imigrantes e refugiadas são exploradas e presas por serem lidas como criminosas terroristas que saíram de sua terra natal para tomar de assalto os recursos de outra nação.

Veja que a narrativa é fator central para justificar moralmente a aplicação de punições sobre corpos historicamente marcados para morrer. Essa dramaturgia da morte precisa prescrever a legitimidade social que coloca o povo a favor dessas práticas bradando: Mereceu!

Com o passar do tempo essas narrativas de morte precisam se atualizar para incorporar elementos que dialoguem com a contemporaneidade, apropriando-se de maneira perversa dos avanços sociais promovidos por mobilizações populares de corpos dissidentes em luta.

Assim sendo, essas práticas de extermínio executadas pelos imperialistas ocidentais passaram por adaptações e deram origem ao que hoje compreendemos como sistema prisional. A prisão deixava de ser um intervalo entre a condenação e a pena para se tornar a pena em si.

Isso acontece como resposta a três movimentos distintos: a consolidação do capitalismo, as novas éticas sociais estabelecidas pelo iluminismo europeu e a organização dos Estados Nações.

A ética iluminista, que trouxe a derrocada das monarquias e a ascensão das repúblicas, pautava uma humanidade racional, que se organizava e percebia a partir de uma filosofia europeia segregando a espiritualidade e a experiência pelo corpo como coisas menores frente a magnitude intelectual da ciência teórica. Essa reflexão passou a banalizar as execuções da corte como comportamentos primitivos, tendo em vista que essa exposição literalmente visceral do corpo subalterno feria a estética polida do racionalismo iluminista.

A imagem grotesca das execuções e sua estética gore provocada pelos restos mortais chamuscados ou esquartejados por carrascos encapuzados, ia na contramão do novo ideal de humanidade civilizada. Então era necessário criar uma nova alternativa para perpetuar a pedagogia punitivista europeia, sem que os novos ideais da época a colocasse em xeque. O resultado pode ser traduzido na frase popular “prende, mas não mata”.

O desenvolvimento do capitalismo como regulador das relações de produção e consumo trouxe à tona um novo conceito de valor do trabalho. É muito mais lucrativo ter uma pessoa subalterna, trabalhando precariamente para sustentar a elite capitalista, do que morta. Por isso os primeiros modelos de prisão são campos de concentração de trabalho escravo, representado em diversas películas e obras de arte com a icônica imagem de homens racializados vestidos com roupa listrada quebrando pedras com marretas.

Por fim, a constituição dos Estados Nacionais configura a criação de um órgão regulador que passa a legitimar o direito de aprisionar corpos subalternos, tendo em vista que esse mesmo Estado passa a ser responsável pela ordem social e por coreografar a “paz” entre os humanos.

Esse fenômeno estabelece — pelo menos em corpos privilegiados — uma sensação de equilíbrio, onde a justiça parece ter conseguido equilibrar a sua balança. Afinal, instalações serviriam como depósitos de pessoas más, apartadas do convívio com os cidadãos de bem, sem que isso gerasse o ônus de que essa sociedade da moral ostentasse o penoso título de genocida.

Para reforçar essa falsa sensação de segurança, temos uma série de produções da cultura pop, que aparecem em mídias diversas, reforçando a narrativa do punitivismo como uma necessidade para a manutenção da ordem da humanidade. Vou dar um exemplo:

Independentemente da geração, não importa a idade, qualquer pessoa viva nessa terra já deve ter lido ou ouvido falar do Batman, super herói dos quadrinhos da DC Comics criado por Bob Kane e eternizado nas películas de cinemas por renomados atores de Holywood como George Clooney, Christian Bale, Ben Affleck e, mais recentemente, Robert Pattison. Batman é a identidade secreta de Bruce Wayne, um órfão milionário que teve seus pais assassinados quando muito jovem e decide, depois de uma longa jornada de treinamento com uma Liga de Assassinos, tornar-se um vigilante que quer trazer a paz para sua conturbada e violenta cidade Gotham City.

Para isso, Wayne conta com um arsenal de última geração de armas não letais para conter a diversidade de bandidos alucinados que compõem o pesadelo urbano que é a cidade. A esmagadora maioria de nós, independentemente da geração, cresceu com o imaginário dessa figura heroica presente em algum momento da vida. E, não raramente, quando postos diante das tensas narrativas de suas histórias, nos vimos torcendo para que o Cavaleiro das Trevas pudesse levar seus antagonistas vilanescos a justiça, para que isso nos trouxesse uma sensação de redenção por todo o mal que tais malucos provocaram aos cidadãos de bem de Gotham. Mas por um acaso já paramos para pensar que é justamente a riqueza ilimitada de Bruce Wayne que fomenta a desigualdade social e a pobreza de dezenas de milhares de famílias em Gotham? Wayne e sua família são os principais responsáveis pela violência generalizada da cidade e a forma como ele decide lidar com isso é realizar o que ele acredita (e propaga) ser justiça.

Bruce Wayne segue o mesmo código de conduta da sociedade capitalista-punitivista de nossos tempos: ele não mata. Ele prende! Encarcera seus adversários em espaços de desumanização, que tratam seus reclusos como animais, com péssimas condições de alimentação, espancamentos, castigos, medicação compulsória, isolamento social...

O Batman é um símbolo icônico da sociedade punitivista. Ele representa a figura das elites que empobrecem a população e a coloca em situações precárias de sobrevivência, tornando-se animais movidos pela fome e pela insanidade de quem vive em uma sociedade de consumo sem o poder de consumir. E quando esses corpos se rebelam, ou reagem à criação cruel que tiveram às margens de todos os acessos, são castigados por essas mesmas elites enquanto a sociedade os aplaude como heróis.

Em seu filme mais recente, The Batman (2022), a primeira fala do personagem protagonista é: “Eu sou a vingança”. E é exatamente aí que reside o perigo. Vivemos em uma sociedade onde justiça e vingança são tratadas como uma coisa só.

Vivemos em uma sociedade onde justiça e vingança são tratadas como uma coisa só

É muito comum, entre aquelas pessoas desavisadas, ouvir relatos (sem nenhuma experiência) de como as prisões são verdadeiros resorts de vagabundos que estão ali mamando nas tetas do erário público. “Comem, bebem e dormem nas costas do governo” – dizem. Engraçado que, apesar dessa mitologia das penitenciárias enquanto “Terra do Nunca onde ninguém precisa crescer ou trabalhar”, essas mesmas pessoas desavisadas parecem ter um medo absurdo do sistema prisional. Ninguém quer ir para esse resort!

A verdade é que as prisões são uma das mais refinadas estratégias do capitalismo contemporâneo. Isso porque elas dão conta de executar o projeto eugenista das elites, ao retirar das ruas corpos indesejados que não fazem as rodas do mercado girar ao mesmo tempo em que produzem lucro.

Desde 2019, tenho vivido o abolicionismo penal como estratégia de luta por dignidade e bem viver comum no contexto urbano. São as prisões e o medo delas que silenciam e domesticam nossas reações de rebeldia e insurgência, que poderiam interpelar os poderosos que nos mantêm no andar de baixo.Desde 2019, tenho vivido o abolicionismo penal como estratégia de luta por dignidade e bem viver comum no contexto urbano. São as prisões e o medo delas que silenciam e domesticam nossas reações de rebeldia e insurgência, que poderiam interpelar os poderosos que nos mantêm no andar de baixo

E nesses anos, entre idas às saidinhas temporárias e trabalhos de acolhida com pessoas sobreviventes do sistema prisional tenho coletado histórias que ajudam a compreender a urgência que temos, enquanto humanidade e sociedade progressista, de pôr um fim definitivo às prisões e ao punitivismo.

Quando iniciamos a Cia dxs Terroristas, éramos muito jovens, alguns até mais do que se espera de um grupo ativista. Ainda nem passava pela nossa cabeça a ideia de enfrentar as grades do sistema prisional e suas consequências para a manutenção do capitalismo escravocrata contemporâneo. Mas nossos primeiros movimentos eram de busca por liberdade. Pelo direito de ir e vir sendo quem somos. E, para isso, compreendendo que estávamos ilhados, começamos a mapear nossos pares, a formar nosso pequeno primeiro grande batalhão.

Uma das terroristas tinha chegado para o nosso ensaio com uma cara de indignada. Perguntei o que tinha acontecido e ela me disse: “Você viu o noticiário? Aquele tal de Bolsonaro deu outra entrevista afirmando que grupos de esquerda querem instaurar uma ditadura gay no Brasil. Esse cara não tem noção”.

A gente se olhava nos olhos uns dos outros enquanto ouvíamos o relato, rindo por vezes dessa piada sem graça que mais tarde se tornaria presidente do Brasil, pensando criativamente sobre aquilo. Em um dado momento alguém dispara: “E se a gente fizesse essa ditadura gay, aí? Pode até ser divertido imaginar como seria se, por alguns instantes, a cisheteronorma trocasse de lugar com a gente e tivesse que sentir na pele os nossos ‘mimimis’”.

Essa conversa se transformou no projeto DitaduraGay que consistia em performar “ditaduras gay” em espaços cisheteronormativos da zona norte de São Paulo. Realizamos marchas de mulheres LGBT 2https://www.youtube.com/watch?v=5IeHUE-QYOY na porta de igrejas neopetencostais, realizamos performances3https://www.youtube.com/watch?v=NoLzq-osW-s ; https://www.youtube.com/watch?v=rRUWhFtaM8A, um festival4https://www.youtube.com/playlist?list=PLgMtWkqOwc5ZzQ6DfGIp2LP_76lSM0dC_, e oferecemos oficinas de produção de autonomia e produção criativa em espaços com pessoas LGBTQIA+ vulneráveis. 

Nessas últimas ações, chegamos ao centro de Acolhida Zaki Narchi, onde conhecemos o coletivo Valérias. Trata-se de um grupo de mulheres trans e travestis que estavam organizadas na luta por moradia e que carregavam consigo o nome de uma companheira que havia sido assassinada dentro desse mesmo albergue misto em um ato transfóbico. 

Foi nesse processo de convívio com as Valérias que voltamos nosso olhar para o sistema prisional. Praticamente todas as manas que estavam conosco tinham passagem pela prisão e carregavam consigo a dificuldade dupla de conseguir inserção social e no mercado de trabalho por terem o duplo estigma de travesti e criminosa. Já munidas de tecnologias de trabalho construídas ao longo dos anos da CiA, conhecemos o pesquisador Victor Serra, que também escreve nessa edição da Periferias 7, e que nos trouxe sua pesquisa e experiência acerca do encarceramento de mulheres trans e travestis.

A Cia dxs Terroristas já tinha entendido que uma de nossas expertises era a de transformar sonhos, devaneios e metodologias de pesquisa em modos de ação direta e foi exatamente isso o que fizemos. O trabalho de Serra tornou-se o projeto TRANSgressoras ou Como Recuperar o Fôlego Gritando, contemplado pela 4ª edição da Lei de Fomento à Cultura das Periferias da SMC/SP. Nesse projeto, redistribuímos bolsas em dinheiro para que um grupo de 24 mulheres trans e travestis sobreviventes do cárcere pudessem realizar formações em arte a fim de produzir conteúdo estético-político que denunciasse as violações de direitos que o Estado havia provocado sobre suas corpas com o cárcere.

Se, por um lado, as formações em arte possibilitaram repertórios expressivos que viabilizaram canais de denúncia em primeira pessoa para essas mulheres, por outro foi um espaço de formação técnica que garantia a algumas delas a produção de renda ou conquista de emprego digno.

Os materiais produzidos 5https://open.spotify.com/show/47Oc1a7lsCQt8AtZZRg4W5 ; www.ciadxsterroristas.com/transgressoras chegaram até a CPI que investigava violências contra pessoas trans na cidade de São Paulo, a convite da vereadora Erika Hilton (PSOL), em duas ocasiões: para denunciar maus-tratos que essas mulheres recebiam em um serviço de acolhida especializado (e que culminou na demissão do da equipe que provocou tais abusos) e para debater as condições acerca do cárcere de mulheres T nos CDPs do município.

Dessas histórias, poderíamos enumerar um universo sem fim de debates urgentes, que rapidamente nos levariam a uma convicção de que o sistema prisional é uma prática de tortura falida que precisa ser extinguida se ainda queremos manter o que nos resta de humanidade. Mas como um texto não pode dar conta de toda a multiplicidade de contradições que existem nas relações sociais, trago aqui alguns  recortes pautados em marcadores de gênero, quando escolho evidenciar as especificidades que acometem os corpos de mulheres trans/travestis presas.

Trago essas reflexões prévias com um contexto mais amplo sobre o sistema prisional pois seria incoerente e politicamente frágil executar esse recorte sem antes abrir essa cartografia histórica para nos levar a duas afirmações fundamentais que apoiam o debate que aqui se seguirá:

1 – Toda pessoa presa é uma presa política

2 – Toda pessoa presa é destituída de sua humanidade e submetida a dor profunda e tortura.

Vale lembrar que não são os ditos “crimes” que levam uma pessoa à prisão, mas marcadores sociais como raça, gênero e classe.

Se assim o fosse, por que Rosângela Cibele foi para a prisão por ter furtado dois pacotes de miojo, uma Coca-Cola de 600 ml e um pacote de suco em pó, enquanto Thor Batista, filho do milionário Eike Batista, atropelou e assassinou um ciclista por dirigir alcoolizado sem sequer passar uma noite na delegacia?

Por que a travesti Janaína Adans precisa perder quase dois anos de sua vida em uma penitenciária masculina por portar 8g. de maconha e dois pinos de cocaína, enquanto Aécio Neves se envolve em um caso de tráfico com um helicóptero com 500kg de pasta base de cocaína e vira deputado?

Esses são apenas alguns de inúmeros exemplos que podemos dar para afirmar que o sistema prisional opera a partir de marcadores sociais da desigualdade e não pela lógica do crime como pressuposto para punir.

Hoje, a Cia dxs Terroristas é responsável pela Casa da F.U.R.I.A. (Frente Unificada de Resistência Interseccional Abolicionista), onde hoje conseguimos oferecer espaço de acolhida, produção criativa e de renda para pessoas LGBTQIA+ sobreviventes do cárcere.

"Há quem afirme que a invenção da pipa foi chinesa e tem para mais de 3 mil anos. Aulo Gélio, gramático latino, escreveu na Noites áticas que Arquitas de Tarento, matemático amigo de Platão, inventou a primeira pipa. Há quem defenda que foram os hindus, polinésios, fenícios ou egípcios os inventores. A conclusão a que chego é que diversas civilizações inventaram e empinaram papagaios. Ou deliro que as pipas são anteriores aos homens e foram elas que nos inventaram para que alguém as empinasse." (Luiz Antônio Simas)

Eu não sei dizer o que veio primeiro. Suspeito que assim como as pipas inventaram os homens para que eles as empinassem, nós também fomos forjadas pela situação. Foi a necessidade de inventar e ser criativo diante das adversidades impostas pelo sistema cisheteropatriarcal branco e classista que nos forjaram e em resposta a ele que desenvolvemos nossas práticas de terrorismo. Se isso é bom ou ruim, só consigo responder que seguimos em frente, munidos de nossos repertórios e pessoas parceiras, na crença de que um dia nossos devaneios ganharão carne e poderemos (vi)ver um mundo sem prisões. Até lá, a gente continua criando e atentando contra o sistema, trocando pauladas por asas.


 

Murilo Gaulês | São Paulo, Brasil |

Terrorista poético, multiartista, pesquisador e abolicionista penal. Fundador da CiA dXs TeRrOrIsTaS e da Casa F.U.R.I.A. (Frente Unificada de Resistência Interseccional Abolicionista). É doutorando em Artes pela ECA/USP.

murilogaules@gmail.com

@ciadxsterroristas

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